Ironias
de um Otimista Inveterado
*Marcos Inácio
Fernandes
Nesse janeiro e fevereiro
fui tentar ver a CRISE, que a Globo alardeia todo dia o dia todo, do litoral
potiguar. Confesso que fiquei frustrado com o que vi. Saí de Rio Branco para
Natal, com escala em Brasília, na ida e na volta, com os aviões lotados, apesar
das tarifas aéreas nas alturas de vôo de cruzeiro. Em Brasília o aeroporto
cheio. Os assentos das salas de espera de embarque, todas ocupadas. As
lanchonetes da mesma forma. A gente não conseguia uma cadeira desocupada para
fazer um lanche sentado.
Em Natal um fluxo de
turistas intenso. A rede de hotéis com taxas de ocupação elevada. As locadoras
de veículos sem viaturas disponíveis. Os shoppings cheios, os supermercados
cheios, as filas nos caixas eletrônicos imensas, as praias lotadas (mesmo com
estacionamento a 10 reais e uma água de coco a 3 reais.) Fiquei pensando com
meus botões: eita povinho imprudente e perdulário. Desse jeito vão desmoralizar
a crise, que se alastra pelo mundo todo e atinge o Brasil, principalmente, na
bancada do Jornal Nacional.
Dito isso, quero concordar
com o Paulo Henrique Amorim, que diz: “se você desligar a Globo a crise melhora”.
Tiro isso por mim, que fiquei quase 2 meses sem ver a Globo e demais canais de
televisão, vendo pouco a internet, sem
quase postar nada no meu blog e no face e nunca me senti tão bem e revigorado.
Pude constatar, que o nosso povo trabalhador, está desmoralizando a crise. Que
o diabo não é tão feio quanto a Globo pinta. Ainda temos muita gordura prá
queimar e não seremos intoxicados e envenenados pelas vivandeiras da mídia
familiar, que anunciam o apocalipse todos os dias.
Mas a crise existe. Ela é
real. Ela é, principalmente, uma crise de confiança nas instituições, políticas
e econômicas, nas lideranças, nos partidos, nos parlamentares, nos empresários.
Enfim, ela atinge e perpassa todo o tecido social. Constatei isso de perto em
conversas com amigos, familiares e pessoas simples do povo com os quais mantive
contato e entabulei conversas. Os diálogos foram difíceis, mesmo com pessoas
que se dizem bem informadas e bem intencionadas. O senso comum está arraigado e
difícil de ser rompido para uma discussão em bases mais civilizadas. As
desilusões são grandes. A indignação seletiva, da mesma forma. Só um exemplo:
Uma minha cunhada, católica e temente a Deus, numa conversa comigo exclamou,
com tanta raiva, que por ela “matava os bandidos tudinho”, se implantava a pena
de morte e a lei de Talião: “dente por dente, olho por olho”. Matou, morreu.
Roubou, cortou a mão. Mentiu, cortou a língua. Estuprou, cortou o pinto. E que
os direitos humanos só defende bandidos e que os menores tem que ser presos
mesmo e por aí... E eu pensando, se uma pessoa boa e religiosa pensa assim, se
houvesse um plebiscito para a implantação da pena de morte no Brasil, ela
ganhava, disparado.
Mas, realmente, o clima de
insegurança está grande e os programas policiais, como Patrulha da Cidade, em
Natal, e Cidade Alerta, em Rio Branco, e programas de TV como o de Datena,
ajudam a espalhar o pânico e transformam delinquentes em pop star. Há uma
corrida por proteção individual e pelo patrimônio, que se reflete no Parlamento
com a bancada da bala. Essa bancada defende o porte de arma para o cidadão e
medidas mais enérgicas de segurança. Enquanto o Estado não garante a nossa
proteção, cada um se vira como pode. Por pressão familiar tive que reforçar a cerca elétrica
da minha casa e colocar aqueles arames horrorosos de penitenciária no muro,
desfalcando o meu orçamento em R$ 1.300,00, além de pagar um vigilante motorizado
40 reais por mês.
Também vi a crise de perto
no desemprego. No tempo que passei em Natal, 3 parentes meus foram demitidos de
seus trabalhos, na indústria de confecções, no comércio e serviços. Para eles a
inflação vai ser de 1000% ao dia depois do auxílio desemprego. O agravante
desses casos é que o desemprego, atingiu de uma só cacetada, um casal, meus
sobrinhos, com filha recém - nascida. Para sorte deles a nossa família é
solidária e a filha deles não corre risco de passar necessidades maiores. A
falta de trabalho e o desemprego é a face mais perversa da nossa crise.
Onde também vi a crise de
perto foi na saúde. Tive que levar a noite, meu neto na UPA de Parnamirim. Ele
apresentava sintomas de desidratação e infecção intestinal depois de uma dia muito
agradável em Tibau do Sul onde se esbaldou de tomar banho de mar e pegar sol. A
UPA é um prédio novo e bem equipado e estava apinhado de pacientes. O que
faltava era profissionais para dá conta daquela demanda enorme. Tinha mais
funcionários atendentes na burocracia fazendo fichas do que médicos. Só havia
dois médicos se desdobrando para atender tanta gente. Felizmente meu neto foi
atendido e medicado e não precisou se internar prá ficar no soro. Melhorou com
a medicação e depois que ficou algum tempo em observação foi liberado. Agora o
que me chamou atenção nesse episódio foi o fato de durante a espera (Passei
mais de 2 horas), meu neto voltou a vomitar nas dependências da UPA (só aquela
água). Imediatamente veio uma funcionária da UPA colocou toalhas de papel sobre
o vômito, limpou e desinfetou o local. Fiquei impressionado com a presteza da
servidora e pensei: que bom seria se todo servidor público agisse assim. Se
todo cidadão se preocupasse com a sujeira e mantivesse seus locais de trabalho,
suas casas, sua ruas limpas? Mormente agora nesse momento de crise, de Zica e
outras patologias que nos ameaçam.
Infelizmente não é o que a
gente assiste nessa quadra da nossa história. As principais instituições e
autoridades ainda não se deram conta da urgência de passar esse país a limpo.
Ainda não tiveram o mesmo senso do dever que a funcionária da UPA de Parnamirim
demonstrou quando limpou, imediatamente, a sujeira no seu local de trabalho. O
Supremo Tribunal Federal não abriu mão do seu recesso, o Congresso Nacional, da
mesma forma.(e são os que ganham os melhores salários e têm mais prerrogativas). E, em ambas as instituições, um bocado de sujeira para limpar,
muito serviço por fazer, muitas decisões por tomar e o Brasil esperando como o
Pedro pedreiro.
Obrigado servidora anônima
da UPA de Parnamirim e aos médicos que cuidaram do meu neto. Vocês renovaram em
mim a esperança de que o Brasil tem jeito, que a crise vai passar e que dias
melhores virão. Quem viver verá!
*Marcos Inácio Fernandes é
professor aposentado e militante do PT.