terça-feira, 30 de agosto de 2016

JABUTICABAS






Jabuticabas

“O Brasil não é para principiantes”
Tom Jobim (1927-1994)

Essa fruta só existe no Brasil. Ela não dá em cachos e se espalha grudadas pelos galhos das jabuticabeiras. A fruta, como muitas coisas do Brasil, é deliciosa.
O impeachment é mais uma dessas jabuticabas. Um crime sem cadáver, sem autor, sem base jurídica. As peças de singelos três decretos de suplementação orçamentária e a implementação do Plano Safra, que é subsidiado com juros muito abaixo dos de mercado e o governo paga aos bancos públicos uma remuneração pelas operações dos bancos públicos junto aos agricultores familiares e do agronegócio. Não se trata de uma operação de crédito entre o governo e os bancos e, ademais, a presidenta não tem participação direta. São acusações débeis, que beiram ao ridículo.
Segundo o depoimento do professor Geraldo Prado, que depôs no Senado, que alguns juristas colegas seus da Europa, quando são informados da situação brasileira dizem que com esses argumentos, tão frágeis, nenhum presidente da Europa duraria 15 minutos.
Em síntese é uma fraude e uma farsa que se consumar com a destituição da presidenta fica caracterizado um GOLPE PARLAMENTAR. Ontem no Senado a presidenta, na sua defesa, reiterou essa questão por diversas vezes. Não basta se respeitar os ritos e a formas processuais. Há que se demonstrar e provar o crime de reponsabilidade com base na Constituição em vigor. E na Constituição não consta nenhum artigo que condene uma presidenta pelo “conjunto da obra”. Só quem pode julgar o “conjunto da obra” é o povo, na sua soberania, através do voto direto e secreto. Apenas ele.
Esse 29 de agosto de 2016 é uma data que vai entrar para a história. Foi o dia que a presidenta Dilma Rouseff se dirigiu, de forma altiva e serena, para fazer a sua defesa nesse impeachment e alertar contra o risco à democracia que esse processo enseja. Fez um pronunciamento brilhante e enfrentou, de cabeça erguida, os seus algozes travestidos de juiz. Uma coisa que me chamou atenção nessa sessão do Senado/tribunal foi que as principais lideranças da acusação fizeram suas perguntas a Dilma de suas mesas. Não usaram a tribuna. Interpretei como um gesto envergonhado a exemplo dos militares que baixaram a cabeça nos tribunais militares em que Dilma foi julgada na ditadura. Os defensores da Presidenta, todos usaram a tribuna.
Ao meu juízo a melhor intervenção foi a do Senador Lindbergh Farias, que a exemplo de Émile Zola, que no caso de outro julgamento histórico que condenou um inocente, o famoso caso do capitão Dreyfus, publicou no jornal  L’AURORE, em 18 de janeiro de 1898, o seu antológico J’ACUSE...!
Lindbergh acusou nominalmente a oposição desleal do PSDB e seu candidato derrotado, Aécio Neves; os conspiradores Cunha e Temer; a FIESP; a Rede Globo e outros. Ainda perguntou quanto tempo levará para a Globo pedir desculpas ao povo brasileiro por apoiar mais um golpe?!
A intervenção mais lastimável que achei, infelizmente, foi o do representante do nosso Estado, Senador Sérgio Petecão. De forma confusa ele se referiu as questões paroquiais do seu litígio com Tião Viana e perguntou coisas que não fazem parte dos autos. Queria saber porque Dilma teria dito na campanha de 2014 que: “prá ganhar se faz o diabo” e perguntou qual o trato que Dilma havia feito com o diabo e se não seria melhor ter tratado com Deus? Desperdiçou uma grande oportunidade de pedir mais esclarecimentos sobre o que se está julgando, se expôs ao ridículo e de quebra ainda nos deixou morrendo de vergonha, perante o Brasil e o mundo, pelo baixo nível político e jurídico que se espera de um Senador/juiz.
Hoje,(30/08), no penúltimo capítulo dessa farsa, que são as considerações finais da acusação e da defesa, vimos e ouvimos os argumentos das partes. A acusação com Miguel Reale e Janaína Paschoal reafirmaram que a Presidenta cometeu crime e florearam suas acusações com um discurso político. Seus pronunciamentos  mereceram um observação da Senadora Gleise Hofman, de que os causídicos estavam ali como advogados e, como o tal, deviam se ater ao processo. Se quisessem fazer discursos políticos se elegessem. Pelo que ouvi deles, acredito, que dariam dois bons parlamentares e com um nível bem superior a de muitos Senadores, alguns dos quais, nunca tinha visto nem nas 4 festas do ano.
Quanto a defesa ela foi brilhante e emocionante. Reconheço que sempre achei o José Eduardo Cardozo, foi um péssimo Ministro da Justiça, mas tenho que reconhecer que como Procurador Geral e agora como advogado de defesa tem demonstrado muita competência. Ele foi didático em demonstrar que o processo padece de um vício de origem e de desvio de finalidade; da insatisfação do candidato derrotado, Aécio Neves, que depois que as urnas falaram e deram vitória a Dilma Rousseff, questionou a lisura das urnas e perdeu. Questionou a diplomação e perdeu. Questionou as contas de campanha da coligação vitoriosa, que ainda está em apreciação pelo TSE. Mostrou também todo o boicote que a presidenta sofreu pelo Congresso quando o governo quis fazer os ajustes necessários na economia, pelo contrário, o governo foi bombardeado com as pautas do Eduardo Cunha, que implicava em mais crise fiscal. Cardozo desconstruiu uma por uma as acusações. Elas são apenas pretextos, que ao longo do processo foram se ajustando a procura de um crime e sua autora, no caso a presidenta Dilma.
Cardozo, por fim, fez a sua mais emocionante fala. Disse que enquanto Ministro a coisa mais dolorosa que sentia e que mais lhe angustiava era quando, em nome do Estado brasileiro depois do relatório da Comissão da Verdade, tinha que pedir desculpas aos militantes, ex-presos políticos, que foram presos torturados e condenados injustamente na ditadura militar. Ele ficava mais deprimido ainda quando a pessoa já tinha morrido e ele tinha que pedir desculpas a seus filhos e netos. Cardozo perguntou: caso condenem Dilma, qual o Ministro da Justiça, que irá pedir desculpas a Dilma? Se ela já tiver morrido, quem irá pedir desculpas a sua filha e neto pela condenação de uma inocente?
A história haverá de julgar e dá seu veredito final.
No mais é resistir a mais esse golpe no Brasil. Lamentávelmente.

*Marcos Inácio Fernandes é professor aposentado e militante do PT

PS- Ainda bem que esse "julgamento" termina amanhã, pois já não aguento tanto cinismo e hipocrisia. A farsa amanhã se conclui.

domingo, 28 de agosto de 2016

MEU BOA NOITE COM LIBERDADE, LIBERDADE



 LP e CD da peça Liberdade, Liberdade





Da peça Liberdade, Liberdade.

Nessa véspera do dia “D” de tensão e angústias com nossa democracia ameaçada fui reler meu exemplar dessa peça do Millôr Fernandes e Flávio Rangel e também ouvir o CD com a interpretação fabulosa do Paulo Autran.  Eu ganhei o LP dessa peça, do meu amigo, José Silton Pinheiro, assassinado sob tortura pela ditadura militar em 1972. Depois adquiri o CD que fazia parte da coletânea de Nara Leão.
Transcrevo o texto final do espetáculo.
“Às vezes, no fim de uma batalha, nem se sabe quem venceu; ou o vencedor parece derrotado. Cristo morreu na cruz, mas o cristianismo se transformou na maior força espiritual do mundo. Galileo Galilei cedeu diante da Inquisição, mas a terra continuou gerando ao redor do sol e quatro séculos mais tarde, um jovem tenente anunciou da estrastosfera que a terra é azul. Anne Frank morreu, mas Israel ressurgiu da cinza dos tempos. Quando Hitler dançou sobre o chão da França, tudo parecia perdido. Mas a cada ato de luta corresponde um passo da vitória. (...) A liberdade é viva; a liberdade vence; a liberdade vale. Onde houver um raio de esperança haverá uma hipótese de luta.
Gostaria que meu boa noite tocasse vossos corações numa síntese de fé e de coragem igual ao boa noite de Winston Churchil, em 1940, atravessando o Canal da Mancha numa silenciosa e fria madrugada: “E agora, boa noite. Durmam a fim de recobrar forças para o amanhã; pois o amanhã virá. E brilhará claro e limpo sobre os bravos, os honestos, os de coração sereno, brilhará sobre todos os que sofrem por esta causa e, mais gloriosamente, sobre a campa dos heróis. Assim será nossa alvorada. Boa noite.

O CABARÉ DO RENAN


Charge do The New York Times.


O CABARÉ DO RENAN

Por: Marcos Inácio Fernandes*

Estou estarrecido e deprimido com as cenas que os “juízes/Senadores” estão nos brindando nessa fase final do processo de impeachment da Presidenta Dilma Rousseff. Como aposentado tenho tempo e estômago de acompanhar o “tribunal” ao longo do dia, entrando pela noite e o que tenho visto, não deixa dúvidas, tratar-se de uma FARSA e das mais grotescas, escancarada!! Os golpistas nem se dão mais ao luxo de manter as formalidades, os trâmites, os rituais, que se espera e, se exige, de um processo justo e de um julgamento honesto.
Tenho um amigo que diz: “uma coisa é ver outra é contar”. Vou contar o que estou vendo e que me deixa com vergonha desses “Senadores/juízes”, que nesse momento tão grave e delicado que passa a nação deviam mostrar para o Brasil e o mundo um pouco mais de postura e compostura e a liturgia que se espera de um tribunal que vai julgar uma Presidenta eleita com 54,5 milhões de votos. E o que vemos?
1º - Vemos em muitos momentos das sessões um plenário esvaziado, entregues as moscas. Dizem que acompanham as sessões do conforto de seus gabinetes pela TV Senado. Nem querem mostrar a cara com receio de serem filmados. São juízes que se escondem. Eu, particularmente, ainda não vi os outros dois representantes do Acre, Sérgio Petecão e Gladson Camelli, no “tribunal”. Também ainda não vi os “juízes/Senadores” Romário, Crivela, Lobão, Eduardo Braga, Eunício Oliveira e tantos outros;
2º - Os golpistas tem pressa, muita pressa. Já estão com suas opiniões formadas e cristalizadas, que a presidenta cometeu crime e de responsabilidade. E quanta ironia senhores. A presidente prestes a perder o mandato sem que se prove o crime e sua autoria e Eduardo Cunha, que em qualquer página que se abrir o Código Penal pode ser enquadrado em todos os artigos, alíneas e incisos e é réu no STF, o processo se arrasta na Câmara. Pelo visto termina o mandato.
3º - Os golpistas “juízes/Senadores” nem fazem questão de ouvirem, muito menos, de questionarem os depoentes apresentados pela defesa, seja na condição de testemunhas ou de informantes. Tentam desqualifica-las e desmerece-las. Fugiram do debate, pela simples razão de que suas teses foram reduzidas a nitrato de pó de excremento de gato, tanto pela defesa do Eduardo Cardoso, como pelos depoimentos do economista Belluzzo, do professor Geraldo, e do ex-ministro Barbosa. Eles desmontaram as teses das “pedaladas” e da “irresponsabilidade fiscal” atribuídas à presidenta.
4º - Alguns, como o Magno Malta, ficam de brincadeirinhas no “tribunal” provocando os colegas da defesa de Dilma e fazendo considerações desairosas sobre depoentes e na sua ausência. No mínimo uma deselegância e falta de urbanidade e respeito para com os depoentes.
5º - Merece registro o papel ridículo da advogada da acusação, cuja peça original lhe rendeu 45 mil. Como suas teses foram trituradas pelos depoentes que a defesa arrolou, ela quis saber a opinião do professor Geraldo sobre o que achava do julgamento do Mensalão, e da democracia na Venezuela e em Cuba. De tão ridícula e  despropositada a pergunta, o presidente do ”tribunal” Ricardo Lewandosvski, a indeferiu e alertou a causídica que se ativesse aos autos do processo.
Por fim cumpre registrar que entre os inúmeros “barracos” que aconteceram no “tribunal”, um deles foi protagonizado pelo próprio presidente da casa Renan Calheiros, que a título de repreender e questionar a “juíza/Senadora”, Gleise Hoffman, que no dia anterior havia dito que o Senado não tinha moral para julgar a presidenta Dilma, o Renan disse que aquilo ali estava virando um hospício.
A imagem não é a mais que se assemelha ao Senado, Renan. Com a máxima vênia, isso aí está mais parecido  com um cabaré. Um cabaré de 3ª. Aí no Senado alguns apenas se fazem de doidos, destemperados e inconsequentes. Entretanto, nenhum dos Senadores rasga dinheiro e nem comem merda.
 Antigamente os cabarés de alto nível como o Bataclã em Ilhéus e o de Maria Boa, em Natal, eram “instituições” respeitáveis. Tinha ordem, decoro e se preservava as famílias. Havia discrição. E só se vendia o corpo. Nesse cabaré do Senado, que se passa por um “tribunal” por esses dias, se vende até a alma e se compra votos.

Nas próximas sessões do “tribunal” tirem as crianças da sala.

*Marcos Inácio Fernandes é professor aposentado e militante do PT.

terça-feira, 23 de agosto de 2016

DILMA VAI AO SENADO






 Assassinato de Júlio César com 23 punhaladas



Quantas punhaladas levará a Dilma?
 
Dilma vai ao Senado

Por: Marcos Inácio Fernandes*

“A justiça é cega mas a injustiça podemos ver.” (Anônimo)

Nesse final de agosto mais uma tragédia está para ser consumada. Dilma vai ao Senado para ser apunhalada. Ela está sendo vítima de uma conspiração e traição, tal qual, a que se abateu contra Júlio César em março de 44 a.C.
César foi apunhalado 23 vezes. A tragédia foi retratada muitas vezes no teatro e no cinema. Agora, veremos a da Dilma pela televisão, em tempo real e a cores. Serão necessárias 54 punhaladas para o seu assassinato político. Os conspiradores contabilizam algo em torno de umas 60 punhaladas. A conferir.
O que fico me perguntando é: qual será a punhalada mais dolorosa para Dilma. Qual a que ela exclamará, a exemplo de Júlio César, o “até tu, Brutus?” Será o até tu, Cristovam? Até tu, Marta? Até tu, Lobão? Até tu, Garibalde? Até tu, Braga? Pessoalmente a que mais me entristece é a do Cristovam Buarque, cuja punhalada vai atingir, mortalmente, a sua biografia.
Considero também, que no seu pronunciamento no Senado, Dilma podia relembrar e tecer uma analogia com o discurso de Marco Antônio junto ao cadáver de César. Algo, mais ou menos, nessa linha:
“Todos sabem que quem iniciou essa farsa do impeachment foi o então presidente da Câmara, Eduardo Cunha. Mas Eduardo Cunha é um homem honrado!
“O Deputado Jovair Arantes (PTB-GO), deu parecer favorável na Comissão da Câmara. Jovair é um homem honrado!
“Como todos viram no dia 17 de abril, 367 Deputados Federais, sob vários argumentos, apenas desconsiderando a Constituição, votaram pelo prosseguimento do processo. Todos eles são homens honrados!
No Senado, Antônio Anastasia, do mesmo partido que encomendou o parecer do impeachment por 45 mil reais a Janaína Pascoal, o PSDB, foi escolhido relator.
O relatório do Senador Anastasia, do PSDB-MG, não conseguiu encontrar o “crime de responsabilidade”, mesmo assim ele foi favorável a cassação de 54,5 milhões de votos. Mas o Senador Antônio Anastasia é um homem honrado!
Em síntese, jurídica e tecnicamente, foram desmontados todos os argumentos dos golpistas ao longo do processo. Ademais as gravações vazadas das conversas do Sérgio Machado (ex-Senador do PSDB) com Romero Jucá, Renan Calheiros e José Sarney, desnudaram os reais motivos para o afastamento da Dilma – “estancar a sangria da Lava Jato”.
Mas o Senador Romero Jucá, presidente do PMDB, é um homem honrado!
Renan Calheiros, presidente do Senado e do PMDB, é um homem honrado!
José Sarney, ex-presidente do Brasil e do Senado, do PMDB, é um homem honrado!
Esses e outros personagens, com prerrogativas de foro, estarem com processos no STF não causam preocupações, mesmo após o pedido de prisão feito pelo Procurador Geral, Rodrigo Janot, que não foi aceito pela corte, não os impedem de atuarem, como juízes, nesse processo contra Dilma. Está tudo dominado. No Congresso, no Supremo e na mídia.
Aproxima-se o fim da tragédia política. Um golpe na Constituição, na cidadania, no Estado Democrático de Direito. A perda do mandato da Dilma, eleita com 54,5 milhões de votos é apenas um detalhe. Vão virar confetes. A última palavra está com os “juízes” os honrados Senadores. Nesse final de mês eles se tornaram super - eleitores. Seus votos, caso seja dos apenas 54 golpistas necessários para cassação, valerão 1.009.280 votos dos eleitores de Dilma. Caso os golpistas atinjam 60 votos, eles valerão 908.352 dos reles cidadãos e cidadãs que terão os seus votos incinerados.
Vou assistir a incineração do meu voto e uma injustiça ser consumada pela TV-Senado. Lembrando a frase do Mikhail Gorbachev: “Matar o elefante é fácil. Difícil é remover o cadáver”. E o cadáver da democracia deve ser pesado!

Marcos Inácio Fernandes é professor aposentado e militante do PT.

PS - O discurso de Marco Antônio para Júlio César:

Palavras de Marco Antônio no funeral de Júlio César
´ 
Senhores
Vim para enterrar Cesar, não pra elogiá-lo. O mal que os homens fazem vive depois deles ...o bem é quase sempre enterrado com seus ossos. Seja assim com Cesar. O nobre Brutus disse a vocês que Cesar era ambicioso. Se isso era verdade era um grave defeito. E gravemente Cesar o pagou. Pagou com a vida, aqui, pelas mãos de Brutus e dos outros. Pois Brutus é um homem honrado, e assim são todos eles, todos homens honrados. Venho para falar no funeral de Cesar. Ele era meu amigo, fiel e justo comigo. Mas Brutus diz que ele era ambicioso. E Brutus é um homem honrado. Ele trouxe para Roma uma multidão de cativos, cujos resgates encheram nosso tesouro. Isto em Cesar parecia ambicioso?
Sempre que os pobres sofriam Cesar chorava; ora, a ambição deveria ser de matéria mais dura.  Mas, Brutus diz que Cesar era ambicioso.
E Brutus é um homem honrado.
Eu não falo aqui para desaprovar do que Brutus falou. Estou aqui para falar do que sei. Vocês todos o amaram e tinham razões para amá-lo.
Qual a razão que os impede agora de chorar sua morte?
 ("Neste momento Marco Antônio faz uma pausa no discurso, e as pessoas do povo começam a refletir sobre o que ele disse, e a questionar se Cesar tinha afinal merecido a morte que teve. Passado este interlúdio retorna Marco Antônio a falar." )
Ó Justiça! Fostes morar com os animais selvagens, pois os homens perderam o raciocínio!
Ainda ontem, a palavra de Cesar podia enfrentar o mundo. Agora aí jaz. E ninguém tão humilde que o reverencie.
Se tendes lágrimas, preparai-vos agora para derramá-las.
Todos vós conheceis este manto; eu me lembro da primeira vez em que Cesar o usou.
Olhai: por aqui penetrou a adaga de Cássius;
Vede o rasgão que fez o invejoso Casca.
Por aqui passou o punhal do bem amado Brutus. E ao retirar seu aço maldito notai que o sangue de Cesar o seguiu como correndo à porta, a fim de convencer-se de que era Brutus mesmo quem batia de modo tão cruel.
Pois Brutus, como o sabeis, era o anjo de Cesar.
Julgai, Ó deuses, como Cesar o amava!
Este foi o golpe mais cruel de todos, pois quando o nobre Cesar viu-o apunhalando, a ingratidão, mais forte que a mão dos traidores, o derrotou completamente;. 
Aí seu poderoso coração partiu-se...e escondendo o rosto neste manto, o grande Cesar caiu aos pés da estátua de Pompeu que escorria sangue o tempo todo.
Oh, que queda foi aquela, camaradas!
Eu, vós, nós todos caímos nesse instante
Enquanto a traição sangrenta crescia sobre nossas cabeças.
Eu não vim para acirrar paixões;
Apenas falo reto e vos digo somente o que todos sabeis;
Mas fosse eu Brutus – e Brutus, Marco Antônio,
E haveria aqui um Marco Antônio capaz de sacudir as almas,
colocando uma língua em cada ferida de Cesar, para erguer em
revolta as pedras de Roma!
Pois este era um Cesar!
Como ele, que outro haverá?

(" Revoltada a massa sai rumo às casas dos conspiradores para vingar Cesar.")

(“JULIO CESAR” de William Shakespeare – tradução livre de Millor Fernandes)