segunda-feira, 15 de agosto de 2016

AGOSTO






 


Vão rasgar os nossos votos




AGOSTO

Por: Marcos Inácio Fernandes*



Esse mês é emblemático na história e no calendário cívico brasileiro. No processo da Revolução Francesa, em fins de agosto de 1789, foi aprovada a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão. Nos artigos 8º e 9º desse documento histórico estabelecia que: “A lei só deve prescrever castigos que são indubitável e evidentemente necessários e ninguém pode ser punido a não ser por força de uma lei aprovada, divulgada e juridicamente aplicada antes do cometimento do crime.” O 9º estabelecia que: “Cada homem é considerado inocente até que seja declarado culpado, se sua detenção for considerada inevitável, todo rigor que não seja necessário  pra assegurar a detenção deve ser severamente proibido por lei”
. Em 10 de agosto de 1792, ainda no bojo da Revolução Francesa, Luís XVI, era deposto e posteriormente guilhotinado como está prestes a acontecer com Dilma. No Brasil, em 1798, deu-se a Revolta dos Alfaiates, que foi um dos movimentos pela nossa emancipação política. No início do século passado, em 6 de agosto de 1902, tinha início a Revolução Acreana cujo desfecho incorporaria, definitivamente, o Acre ao Brasil. Mais recentemente, em 2002, o TRE do Acre cassou a candidatura  do Jorge Viana a reeleição ao governo sob o pretexto de usar o símbolo da castanheira estilizada. O TSE revogou a sentença e o Jorge foi reeleito e fez o sucessor, Binho Marques, que passou o bastão para Tião Viana, que também se reelegeu e vai consolidando a trajetória de 18 anos de governos do PT no Acre.
Pessoalmente já vivi e vivenciei dois agostos trágicos na minha vida. No primeiro, em 1954, quando Vargas, dando um tiro no peito, adiou o golpe em 10 anos, eu estava em Fernando de Noronha na casa do meu avô materno e acompanhei a tragédia pelo rádio. Naquele  24 de agosto, há 62 anos, não houve aula na escola da ilha e as bandeiras brasileiras no comando do exército e no destacamento da FAB foi hasteadas a meio pau. Em 1961, quando Jânio Quadros renunciou no dia do soldado em 25 de agosto, eu morava em Parnamirim e já fazia a 1ª série do ginasial. Lembro que a Base Aérea de Natal, onde meu pai serviu, ficou de prontidão por uns 15 dias  sob o comando do então Tenente Coronel Aviador João Paulo Moreira  Burnier,  que mais tarde iria protagonizar o escândalo do PARA - SAR**. Naquela ocasião, os militares linha duras, não queriam  permitir a posse constitucional de João Goulart, que estava em visita oficial à China. Aventava-se até mesmo a derrubada do avião que lhe trazia de regresso. Foram dias dramáticos. Graças a resistência do Brizola no Rio Grande do Sul, com sua “Cadeia da Legalidade”, Jango assumiu, com poderes diminuídos, no bojo de um remendo Parlamentarista de ocasião. Depois veio o Plebiscito que restaurou o Presidencialismo e o golpe que Vargas adiou por 10 anos, foi consumado em 1964.
Hoje a história se repete como farsa. A farsa do impeachment, que não passa de um golpe parlamentar/jurídico/midiático. Está escancarado. A presidenta Dilma cometeu muitas faltas, mas entre elas não está o CRIME DE RESPONSABILIDADE e a luz da Constituição não poderia ser cassada. O julgamento será político e não será pelos erros cometidos por Dilma, mas pelos seus acertos, inclusive, o de passar esse país a limpo através de investigações autônomas e de não se submeter as chantagens dos bastidores do poder e nem de saber usá-lo direito. Estivemos no GOVERNO, mas,  não soubemos exercer o PODER. Os que sempre detiveram o PODER souberam usá-lo contra o nosso projeto político e o GOLPE está para ser consumado e será uma amarga lição para os democratas.
Fica algumas lições: a primeira é que caráter não é uma prerrogativa da esquerda. E entre as pessoas que demonstraram uma firmeza de caráter nesse processo, está outra mulher, a  Kátia Abreu. Confesso que torci o nariz quando ela foi nomeada por Dilma e hoje tiro o chapéu para sua dignidade. Que grande lição a Kátia oferece á Marta Suplicy e ao Cristovão Buarque!! Acho que Dilma devia ir ao Senado fazer a sua última defesa apenas para agradecer a Kátia Abreu. A segunda lição é a resistência e a fibra da presidenta Dilma. Julgada e condenada por um Tribunal Militar na ditadura e agora julgada e prestes a ser condenada por um “tribunal civil” – o Senado, sem ter cometido crime. Dilma não se suicida, não renuncia e, pelo contrário, denuncia o golpe e cria um constrangimento inominável aos seus algozes. Resiste e combate com todas as suas energias e coragem. A terceira lição: é que apesar da “surda força dos vermes”, ( Cecília Meireles no seu Romanceiro da Inconfidência ), o Brasil não finda em abril nem em agosto. Outro poeta, Félix Augusto de Athayde, deixa esses versos para a nossa reflexão “Brasil não finda em abril (nem em agosto)/Nem finda em mim nem em ti /Há outubros e há outros, outros /Além de nós que sabem /No amor e no ódio /Que o tempo é a esperança dos homens / Há outubros.”

Nesses tempos de olimpíadas e de impeachment, me ocorrem duas observações, pessoalmente lisonjeiras. Estou com o coração e o estômago funcionando perfeitamente. O coração, para suportar um Brasil e Espanha e Brasil e Argentina no basquete masculino e o estômago para suportar os discursos de Magno Malta e Ana Amélia no Senado, sem vomitar.

*Marcos Inácio Fernandes, é professor aposentado e militante do PT.




** O capitão Sérgio Carvalho (Sérgio Macaco) recusou a ordem de matar e denunciou o brigadeiro João Paulo Moreira Burnier, que queria explodir o gasômetro do Rio de Janeiro, dinamitar uma represa e jogar 40 líderes políticos no oceano entre eles Juscelino, Lacerda e D. Hélder Câmara para colocar a culpa nos comunistas. Eis o diálogo entre o brigadeiro Burnier e o capitão Sérgio:
 O senhor tem quatro medalhas por bravura, não tem?, perguntou o brigadeiro João Paulo Moreira Burnier, chefe de gabinete do ministro da Aeronáutica, Márcio de Souza Mello, na quarta-feira 12 de junho de 1968, no 11º andar da avenida Churchill, 157, no Rio de Janeiro, onde funcionava o Ministério da Aeronáutica.
– “Sim”, respondeu o subordinado, o capitão paraquedista Sérgio Ribeiro Miranda de Carvalho.
– “Pois a quinta quem vai colocar no seu peito sou eu”, avisou o brigadeiro, antes de emendar uma segunda pergunta. “Capitão, se o gasômetro da avenida Brasil explodir às seis horas da tarde, quantas pessoas morrem?”
– “Nessa hora de movimento, umas 100 mil pessoas” – respondeu o capitão Sérgio, trabalhando com a hipótese de uma catástrofe.
– “É, vale a pena para livrar o Brasil do comunismo” – concluiu o brigadeiro.

Um comentário:

  1. Professor, quanta admiração dispensada à sua pessoa, pela sua memória, conhecimento e monitoramento às coisas do Brasil, ou melhor, à política brasileira.
    Nosso maior sofrimento, infelizmente, é, pessoas com o seu perfil, é uma "gota d'água no oceano". Daí as idas e vindas desses acontecimentos no percurso da história....
    Nossas considerações!

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