É A BARBÁRIE

É a barbárie.

Por: Marcos Inácio Fernandes.

“Tava roubando o estepe da camionete quando aí...Paaaah. Chegou o dono.”

E o meu amigo Léo compartilha no WhatsApp da família Fernandes o vídeo de 33 segundos, mostrando  o ladrão pé de chinelo sendo imobilizado por um e espancado com violência, na bunda, por outro homem. Eis a brutalidade.

https://www.youtube.com/watch?v=pPTJuKpnYy0

E parece que os demais membros da família, que é uma família decente e pacata, acharam natural e aplaudiram a surra no ladrão. Na ocasião deixei meu comentário: “Que barbaridade é essa? Coisa chocante!”. Agora teço minhas considerações mais detalhadas sobre a postagem.

1 – Postagens desse tipo contribui para se fazer uma apologia da tortura, da violência, da covardia, do uso da força desmedida. A se fazer “justiça com as próprias mãos”. Ou seja, se fazer justiçamento,  linchamentos;

2 – Desde que o homem saiu do seu estágio selvagem e bárbaro e entrou na CIVILIZAÇÃO, a partir da domesticação dos animais e das plantas e inventou a POLÍTICA, foi precisamente para se resolver os conflitos, sem a necessidade da violência e do extermínio físico. Para tanto se criou as leis e a justiça, que vem evoluindo e se aprimorando ao longo desses 10 mil anos de civilização;

3 – Nas sociedades modernas e civilizadas, só quem pode exercer a força de forma legítima é o ESTADO, através do seu aparato policial, militar e judicial. (Max Weber). Fora disso é a barbárie. Ademais, o Estado só deve usar a força com moderação, para não virar o Estado/Leviatã, todo poderoso, de que nos falava Hobbes;

4 – Não justifica dizer que as instituições não funcionam a contento. Embora seja verdade, se todos se arvorarem a usar da força para fazer justiçamentos, substituindo as polícias e os tribunais, então estaremos no caos. Será “lei dos mais fortes”, do “salve-se quem puder”, a “guerra de todos contra todos”;

5 – Esses roubos também me indignam. Mas fico mais indignado com os roubos de “colarinho branco”. Da sonegação de impostos e com as fraudes fiscais, que a operação Zelotes mostrou. Ela indiciou alguns, mas ainda não prendeu ninguém. E são bilhões de reais. 580 bilhões prá ser mais preciso, envolvendo 74 empresas, seus dirigentes, altos burocratas da Receita, Ministros do TCU, Senadores e advogados;

6 – Não gostaria de ver os sonegadores como os irmãos Marinhos da Globo;  Joseph Safra, dono do banco SAFRA; Luiz Trabuco, do Bradesco; André Gerdau, do Grupo GERDAU; e mesmo um ladrão como Eduardo Cunha, nu da cintura prá baixo e apanhando na bunda, como esse ladrão pé-de-chinelo;

7 – Torço que todos tenham um processo legal, com direito de defesa e se julgados e condenados cumpram suas penas. Eu me satisfaria com o pagamento do que roubaram e penas alternativas, com as tornozeleiras e em prisão domiciliar, privados do convívio social.

Lembrando por fim que, mesmo os ladrões, de colarinho e sem colarinho, merecem um pouco de dignidade e de um tratamento mais humanitário. Não pactuemos e nem estimulemos a violência nessa família encantadora.

Att. Marquito

PS. Caso tenha melindrado alguém, peço desculpas. É que fiquei indignado com a cena abaixo.

CASA DE TAIPA

No nordeste, o povo costuma dizer das mulheres que não são mais "moças" . que elas "levam mais vara do que casa de taipa" ou então,  "levam mais varas do que chiqueiro de criar bode". Estive numa casa dessas em Martins com meu amigo Paulo Henrique. Fizeram um protótipo de uma casa de taipa numa Pousada que tem por lá. Agora vocês ficam sabendo da pertinência da comparação que os nordestinos fazem. Também apresento um improviso em martele de 10 pés dos cantadores Rogério Menezes e  Raimundo Caetano, com esse mote: Toda casa de taipa abandonada
Guarda um grito de fome dentro dela

 

Improviso de Rogério Menezes (RM) e Raimundo Caetano (RC)

“Toda casa de taipa abandonada

Guarda um grito de fome dentro dela”

RM – Numa casa de taipa eu fui criado

Sem riqueza, sem luxo e sem fartura

Sem apoio, sem crédito e cobertura

Para os trabalhos humildes do roçado

Mas na seca meu pai foi obrigado

Levar nós e os cacos prá favela

Que o governo burguês nunca deu trela

Para os escravos do cabo da enxada

Toda casa de taipa abandonada

Guarda um grito de fome dentro dela.

RC – Toda casa de taipa é com certeza

O retrato do caos e do dilema

Da ganância por parte do sistema

Que sufoca o destino da pobreza

Peça fúnebre de um filme de tristeza

Onde o rosto  da crise se revela

Ao invés de ser lar é uma cela

Onde toda esperança é condenada

Toda casa de taipa abandonada

Guarda um grito de fome dentro dela.

RM – Numa casa de taipa no sertão

Que por sorte ou azar ainda tem gente

Tem um cepo servindo de batente

Uma cama de vara sem colchão

Lenha seca cortada pro fogão

Dez caroços de fava na panela

Um jumento empurrando uma cancela

E um cachorro latindo na calçada

Toda casa de taipa abandonada

Guarda um grito de fome dentro dela.

RC – Uma casa de taipa não conforta

E é o palco pras cenas do sufoco

Onde os sonhos falecem pouco a pouco

Quando nasce esperança é quase morta

Quem for alto não passa pela porta

Um menino não cabe na janela

E quando as duas se juntam a noite e ela

Vaza luz na parede esburacada

Toda casa de taipa abandonada

Guarda um grito de fome dentro dela.

RM – Um casa de taipa que o roceiro

Faleceu por miséria ou abandono

O silêncio virou-se um do dono

Assumindo o espaço do primeiro

E atirado no lixo do terreiro

Tem correia, gibão, perneira e sela

Uma cruz, um rosário e uma vela

Assustando quem passa na estrada

Toda casa de taipa abandonada

Guarda um grito de fome dentro dela.

RC – Uma casa de taipa é a feição

Da política corrupta e desigual

Da profunda injustiça social

Que condena o país a escravidão

Faz do povo uma peça de exclusão

E os direitos humanos atropela

Se existe justiça, cadê ela

Se a verdade tem voz ficou calada

Toda casa de taipa abandonada

Guarda um grito de fome dentro dela.

RM – Sem inverno e sem verba do Planalto

Muito pai campesino foi embora

E no subúrbio da rua reza e chora

Onde a voz da miséria fala alto

O seu filho hoje é mestre de assalto

E sua filha que ainda era donzela

Integrou-se ao elenco da novela

Que transforma uma santa em viciada

Toda casa de taipa abandonada

Guarda um grito de fome dentro dela.

RC – Uma casa de taipa é na verdade

Baixa, estreita, pequena, alagadiça

Moradia dos órfãos de justiça

Desprovidos de voz e liberdade

Os que querem direito e igualdade

Não conseguem gostar mas vivem nela

Não precisa vigia ou sentinela

Que a miséria não pode ser roubada

Toda casa de taipa abandonada

Guarda um grito de fome dentro dela.

RM – Foi o povo do campo pras cidades

Sem convite, sem casa, sem emprego

E a família ficou sem ter sossego

Desprezadas das vis autoridades

E ao invés de suprir necessidades

Aumentar essa crise que vem nela

Que a elite, opressora, rica e bela

Não escuta os gemidos dos sem-nada

Toda casa de taipa abandonada

Guarda um grito de fome dentro dela.

RC – Uma casa de taipa é mais ou menos

O refúgio que abriga as desventuras

O celeiro que guarda as amarguras

E sufocando os desejos dos pequenos

Onde os rostos são pálidos e serenos

Como quem não tem chances, mas apela

A “magrinha” exibida nas costelas

A barriga vazia e a mão sem nada

Toda casa de taipa abandonada

Guarda um grito de fome dentro dela.