CARTA
ABERTA À CIDADÃ KATIA ABREU
Excelentíssima senhora
Katia Regina Abreu
M.D. Senadora do PMDB pelo
Estado do Tocantins.
Brasília – DF.
Dirijo-me,
respeitosamente, a vossa excelência para pedir desculpas e fazer um
agradecimento e um reconhecimento público. O faço respeitosamente, (destaco em negrito), porque um certo Senador, que
se comportou indevidamente com vossa excelência levou um copo de vinho na cara.
Naquele incidente, a senhora como mulher, esposa e mãe, não contemporizou. Não
deixou barato a gracinha com a insinuação maldosa a seu respeito. A senhora
mostrou que não é de levar desaforo prá casa e confirmou o ditado: “respeito é
bom e conserva os dentes” e também mantém a roupa limpa. A senhora se dá ao respeito. Vibrei com a sua
atitude naquela ocasião, mesmo porque, não nutro nenhuma simpatia, como ser
humano e político, pelo seu agressor.
Dito isso, quero me
apresentar. Sou Marcos Inácio Fernandes, natalense de nascimento e acreano por
opção. Sou da geração pós- guerra. Não venho de tão longe, como dizia o
Brizola, mas já vivi e vivenciei três golpes. Contra Vargas, em 54, contra
Jango em 64, e o atual do ano em curso, consumado agora nesse 31 de agosto de
2016. Sou pai de um casal de filhos e avô. Tenho um neto de 4 anos. Como sou
pouco religioso, sempre abençoei meus filhos com um “TENHA DIGNIDADE”. Muita gente
da família estranhava essa benção tão pouco usual. Eu o fazia e, faço ainda,
porque meu pai dizia que: até prá pedir esmolas você tem que ter dignidade.
Hoje acrescento na benção do meu neto, além da dignidade, saúde, felicidade e
vergonha. No princípio ele dizia “não quero vergonha não vovô” e eu replicava,
mas vergonha é bom, Arthur e tentava convencer uma criança de 4 anos dessa
virtude. Agora ele já está repetindo a benção comigo sem questionar.
Sou professor
universitário aposentado pela UFAC, com a qualificação de Mestrado do Curso de
Ciências Sociais. Meu bacharelado foi em Sociologia, que cursei quando a gente
tinha um AI-5 particular, o Decreto-Lei nº 477, baixado em 1969, por Costa e
Silva. Em virtude disso levei 6 anos para terminar o meu bacharelado. Fui
incurso na Lei de Segurança Nacional e amarguei prisão e apenas 1 sessão de
tortura física. As psicológicas e morais foram inúmeras. Por isso entendo todo
o sofrimento por que passou e passa Dilma Rousseff. Uma mulher torturada, na
pele, pela ditadura e torturada, na alma, pela democracia, que ela ajudou a
construir. Quanto infortúnio e ironia.
Sempre militei na esquerda
e cultivei o ideário socialista. Na juventude, militei no Partido Comunista
Brasileiro Revolucionário – PCBR, do patriota Apolônio de Carvalho; na idade
madura, no Partido Comunista Brasileiro – PCB (O Partidão), que ajudei a
organizar no Acre, nos anos 80, ainda na semi - clandestinidade. E aqui faço um
parênteses: o destino poupou Luís Carlos Prestes, Gregório Bezerra, Giocondo
Dias, Salomão Malina, Dr.Vulpiano e outros históricos comunistas, que já
partiram, de ver o glorioso Partidão, matriz de todas as agremiações de
esquerda, transformado no PPS - Partido Popular Socialista, que nem é popular,
muito menos, socialista e agora apoiando um golpe. Pois bem, atingindo a 3ª idade,
entrei para o Partido dos Trabalhadores – PT, onde estou desde 1992. Parece que
o “declínio” da minha trajetória político/partidária confunde-se e se assemelha
com minha trajetória existencial. Uma relativa regressão.
Além do magistério
superior também atuei na Extensão Rural. Trabalhei na EMATER-AC por muitos anos
onde exerci, além das atividades técnicas, atividades sindicais e de direção.
Exerci cargos de confiança no 1º escalão nos governos do seu colega, Senador Jorge
Viana, que deu status de secretaria ao serviço e transformou a extensão rural
em extensão agroflorestal. Seus dois mandatos de governo, incorporou os
segmentos sociais de seringueiros, ribeirinhos e indígenas como beneficiários
das políticas públicas para o meio rural/florestal.
Espero que, esse breve
relato pessoal, não seja considerado uma forma de jactância. Ele se presta, tão
somente, para dizer, que a minha visão de mundo e da política era
diametralmente oposta a de vossa excelência. Tanto é verdade, que a vossa
nomeação com a do Joaquim Levy para compor o Ministério da Dilma mereceu, de
minha parte e de muitos companheiros, muitas críticas e torci o nariz para elas.
Entre outras críticas, dizíamos que elas simbolizavam uma concessão indevida ao
agronegócio, ao latifúndio e ao mercado. E, em parte, as nossas restrições
tinham pertinência. Mesmo porque a POLÍTICA também é feita de símbolos e
simbologias.
Agora nessa quadra sombria
da vida nacional onde a crise faz aflorar todo tipo de patologias sociais,
políticas e econômicas eu ouso dizer que a econômica é a menos danosa. A crise
maior é a de VALORES. Valores morais, éticos, de princípios, de compostura, de
prudência e parcimônia, entre outras.
E o mau exemplo vem de
cima. Das maiores autoridades e das instituições sociais e políticas. Banaliza-se
e joga-se no lixo conquistas civilizatórias e humanitárias seculares.
Contemporiza-se com o que há de mais torpe na condição humana: CONSPIRAÇÃO,
TRAIÇÃO, DELAÇAO (agora alçada a prática investigatória e ainda premiada),
TORTURAS, CONDENAÇÃO SEM PROVAS, DESLEALDADE, PRESUNÇÃO DE CULPA (substituindo
a presunção de inocência), ASSASSINATO DE REPUTAÇÕES, e INJUSTIÇAS. Muitas
injustiças!!
Nesse processo do
impeachment, que redundou no GOLPE de 31 de agosto, tive a pachorra de
acompanhar pela TV Senado. Estou com tempo, o coração só tem um stent numa
artéria, e o meu estômago é de avestruz.
Mesmo assim, tive ânsias de vômito muitas vezes, com tantas extravagâncias que
aconteceram. O discurso melífluo e pulsilânime do seu colega Cristovam Buarque,
e as histrionices do Magno Malta foram o de menos. Os senhores
“juízes/senadores” nem tiveram uma postura de simulação. Insistiram, ad
nauseam, na aparência em vez da essência; na forma no lugar do conteúdo; nas
versões se sobrepondo aos fatos. Getúlio Vargas já dizia que, na política, as
versões são mais importantes que os fatos. Acontece que os Senadores estavam
também investidos de JUIZES e, como tal, não se comportaram. Desmoralizaram a
Instituição do Tribunal do Jure.
Dessa farsa e desse
embuste e, em meio a tantas calhordices, emerge a figura de vossa excelência,
que a mim, pelo menos, deu lições de caráter e compostura. Foi leal, teve
gratidão, foi solidária, combativa e não tergiversou. Ajudou a construir o único
gol dessa goleada de 61x20, uma derrota, superlativamente, maior e mais trágica
e mais dolorosa do que os 7x1 para Alemanha na Copa, que diziam que não ia ter.
O gol solitário da preservação dos direitos políticos da cidadã Dilma Rousseff,
criminalizada perante a Constituição e indultada politicamente numa mesma
sessão. Agora são dois fantasmas a assombrarem a elite plutocrática. Lula e
Dilma.
Finalizo contando uma
história do folclore político acreano. Nas eleições para Prefeitura de Rio
Branco de 1985, O PCB lançou candidatura própria encabeçada pelos saudoso
professor da UFAC, Pedro Vicente e pelo funcionário estadual Estanislau
Siqueira, um homem simples do povo. Na campanha um eleitor chegou para o
Siqueira e quis fazer graça e tripudiar com o velho militante comunista, na
época, já septuagenário. Deu-se o seguinte diálogo:
- eleitor: Siqueira você
não vai ter voto que encha uma cuia de tacacá. Se tiver 20 votos é muito.
- Siqueira: É voto demais
companheiro. É muito voto!! Significa que ainda tem 20 homens de vergonha em
Rio Branco.
Eu digo o mesmo do
companheiro Siqueira. Que bom que ainda tem 20 Senadoras e Senadores de
vergonha na Câmara Alta do Congresso. A senhora e mais os seus 19 colegas. Os
“20 de Esparta”, que lutaram até o fim. A história há de lhes fazer justiça a
exemplo dos outros 300 guerreiros que, também num final de agosto de 480 a.C, nas
Termópilas, combateram o império Persa de Xerxes, posteriormente, derrotado.
No diário da judia, Anne
Frank, que foi encontrado após seu assassinato, em março de 1945, no campo de
concentração de Belsen, na Baixa Saxônia alemã, terminava assim:
“eu sei como é difícil se
acreditar em alguma coisa, quando há tanta gente ruim; mas acho que o mundo
está passando por uma fase. Passará; daqui há séculos, talvez, mas passará.
Apesar de tudo, ainda acredito na bondade humana. “
Gratidão, Senadora Katia
Abreu. Suas palavras, gestos e atitudes, renovaram minhas crenças na bondade
humana. Quando for a Brasília gostaria de visitar seu gabinete para lhe
cumprimentar pessoalmente.
Respeitosamente, receba
meu abraço fraterno e minhas saudações democráticas.
Marcos Inácio Fernandes –
um cidadão golpeado.
Rio Branco (AC), 6 de
setembro de 2016
(Véspera da data pátria no
194º aniversário nossa emancipação política)
Nenhum comentário:
Postar um comentário