Cinema
– Uma paixão de infância!
Por: Marcos Inácio
Fernandes*
“O cinema é um modo
divino de contar a vida”.
Federico Fellini (1920-1993)
No último dia do ano
(31/12/2020), vi o filme documentário “O Cinema de seu Duca”, por sugestão da
filha do próprio seu Duca, minha amiga Gilberta. O filme documenta o apogeu e
declínio do Cine Argus, que existiu em Castanhal no Pará. Ele me proporcionou
uma viagem mágica por minha infância e adolescência e me fez relembrar alguns
aspectos, que me passou despercebido, num texto que escrevi em junho de 2012,
sobre o cinema da Base de Parnamirim. Achei o texto no meu blog, inclusive com
uma foto do cinema, do acervo de Valério, um conterrâneo e amigo de Parnamirim,
que exerceu o mandato de vereador por bem 10 legislaturas.
Compartilho o texto com
algumas informações adicionais, que o filme “o cinema de seu Duca” me fez
relembrar. Adiciono, também minhas lembranças dos filmes que assisti nos
cinemas de Natal, Rio Branco e outras cidades por onde passei.
Na minha infância e
adolescência, nos anos 50 e 60, tive o prazer de assistir muitos filmes nessa
sala. Os dependentes dos servidores militares da Base não pagavam. Era
descontado um pequeno valor nos salários de nossos pais e a gente dispunha de
uma carteirinha de acesso. As sessões para os civis e militares de patentes
inferiores (soldados, cabos e taifeiros) aconteciam nas terças, quintas e
sábados e nas segundas, quartas, sextas e domingos as sessões se destinavam aos
sargentos e oficiais. Um detalhe: os sargentos e oficiais podiam assistir os
filmes em qualquer dia, enquanto que os militares subalternos e os civis só
podiam frequentar o cinema nos seus dias específicos.
Na tela desse cinema vi
desfilar os grandes astros de Hollywood, que foram nossos ídolos e heróis por
muito tempo. Alan Lady, Gary Cooper, Errol Flin, Marlon Brando, Anthony Quinn,
Cary Grant, Rock Hudson, Yul Brinner, John Wayne, Gregory Peck, Kirk Douglas,
Humprey Bogart, Gordon Scot e John Weismuller (os Tarzans), entre outros. E
tinha as grandes "Divas" do cinema como: Ava Gardner (que eu
considerava a mais bonita daquela época), Elizabeth Taylor, Rita Hayworth (a
Gilda), Kim Novak, Marilin Monroe, Sophia Loren, Candice Bergen, Jane
Mansfield, Katharine Hepburn, Brigite Bardot e tantas outras beldades e grandes
atrizes.
Na nossa infância, os filmes que mais
gostávamos era os "faroestes ou de caubóis", principalmente, quando
tinha índios (hoje tem um "faroeste com índio" e a gente ficava na
maior expectativa), os filmes de espada (de piratas), os de guerra e as
comédias de Jerry Lewis, Cantinflas e os Três Patetas.
Detestávamos os dramas românticos e os
musicais, que chamávamos de "filmes de amor" (hoje o filme é de amor,
não presta não, dizíamos). Nos "filmes de amor", quando havia uma
cena mais quente, de beijo, por exemplo, a turma gritava: "olha o sabão
!!" Também quando criança ficávamos frustrados quando o filme era
impróprio para menores de 18 anos. Eu, particularmente, ansiava para ficar
"de maior" para não perder um filme. Hoje, septuagenário, até acho
graça dos filmes que eram proibidos para menores, naquela época. Na atualidade,
até nas sessões da tarde da TV, tem cenas mais “calientes”.
Não lembro qual foi o
primeiro filme que assisti no Cine da Base Oeste. Lembro com nitidez que a
música que indicava que a sessão ia começar era “Luzes da Ribalta”....”vidas
que se acabam a sorrir /Luzes que se apagam, nada mais...” de Chaplin e Lary
Russel. Também assistimos o “Limelight” (Luzes da Ribalta) de 1952, e outros do
imortal “Carlitos” do Chaplin. Lembro
também, que os espectadores “espantavam” o Condor, da companhia do mesmo nome,
para o seu vôo esplendoroso na tela do cinema. Quando passava filme da Rank, e
o atleta fazia soar o gongo, o Luís Bocão exclamava alto: “ô badalada”!! isso
em todo filme da Rank e, toda vez, a risada era geral.
Além dos filmes, ainda tinha o Tele Jornal do
Canal 100, que sempre encerrava com um clássico do futebol do Rio ou São Paulo,
com o fundo musical “Que Bonito É”, sucesso de 1956, do Luiz Bandeira. E a
“cereja do bolo” cinematográfico era os seriados, que só passavam alguns dias
da semana e que nós aguardávamos com ansiedade. O seriado do Flash Gordon foi o
que mais me marcou.
Essa minha 1ª casa de sonhos
fechou com a desativação da base Oeste, em meados dos anos 60, entretanto,
continuamos a usufruir da 7ª arte, na Base Leste, em outra sala. A Aeronáutica garantia o transporte nos Papa
- Filas, (veículo que transportava mais de 100 pessoas) no deslocamento de
Parnamirim para a Base, mantendo-se o mesmo calendário de funcionamento. No
final dos anos 90, essa sala também foi desativada, mas aí quase todo mundo já
dispunha de televisão e de locadoras de filmes. Nosso amigo, Barnabé, que já
subiu, que foi goleiro do Paroquial e do Potiguar tinha uma locadora de filmes
em Parnamirim.
A nossa cidade, conheceu ainda
uma sala de cinema, que não lembro o nome, que foi instalada por um empresário
chamado Bastos, que tinha um pouco de estrabismo. Ela funcionava onde era a
sinuca e casa de jogos de baralho de Zé Xavier. Nós apelidamos o cinema de
“pulguinha”, pois era uma sala muito acanhada e não muito limpa. O Bastos fazia
tudo, desde os cartazes, a venda dos ingressos e operava as máquinas. A sua mãe
era a receptora dos ingressos na entrada. O grande sucesso de bilheteria do
“Pulguinha” era a exibição de filmes eróticos de baixa qualidade, sem som,
apenas as imagens, que o Bastos colocava a música “Pata- Pata”, de fundo
musical. Os adolescentes ficavam perguntando ao Bastos: “quando vai ter outro
“Pata-Pata”? E quando ele exibia esses filmes, ele mandava a sua mãe sair da
bilheteria e exclamava; mãe saia que vai começar o “tirinete”.
O PRIMEIRO FILME PAGO
NINGUÉM ESQUECE
Natal, desde as primeiras
décadas do século XX, dispunha de muitos cinemas. No Bairro do Alecrim tinha o
São Luís, inaugurado em 1946, com o filme “Amar Foi Minha Ruína”; o São Pedro,
de 1930; e o Cine Olde, de 1960. Na cidade alta, tinha o Rex, inaugurado em
1936, com um filme da Metro, “Melodias da Brodway”, que a companhia mandou
diretamente dos Estados unidos; O Cine Rio Grande, que estreou em 1948; O Cine
Nordeste, de 1958, onde também funcionava a Rádio do mesmo nome e o único com
ar-condicionado; e o Cine Poti, onde também funcionava a Rádio Poti. No bairro
da Rocas, o Cine Panorama, foi inaugurado em 1971, com o filme “007 Contra o
Satânico Dr. Nô”.
No final dos anos 60 e por
toda década de 70, até vir pro Acre, em 1978, frequentei todas essas salas, com
exceção do cine Olde e do Cine Poti. O primeiro filme que “paguei para entrar”,
foi “La Violetera”, no Cine São Luís. Foi nesse cinema, que realizei, a
primeira de minhas “ações subversivas”, jogando um panfleto contra a ditadura
militar, do seu mezanino.
No Cine Rio Grande, o mais
imponente da cidade, o primeiro filme que assisti foi o brasileiro “3 Colegas
de Batina”, com o trio Irakitan na sua formação inicial com Edinho, Gilvan e
Joãozinho. Lembro que eles cantavam Valsa de Uma Cidade, do Antônio Maria. No
Rio Grande também vi o épico “Os Dez Mandamentos” e nos sábados pela manhã
tinha o cinema de arte que o Cine Clube Tirol promovia. Um de arte que assisti
foi o “Sétimo Sêlo”, do Passoline.
Em 1971, fui para Brasília,
onde passei quase um ano. Em todo esse tempo vi apenas um filme. “Quando o
Carnaval Chegar) do Cacá Diegues, um musical com Chico Buarque, Nara Leão e
Maria Bethânia. Quando retornei à Natal e numa viagem que fiz ao Recife,
assisti o western Hombre, com Paul Newman, no Cine Moderno
Quando morei em Salvador, o
filme que guardei na memória, foi “A Festa de Babete”, num cinema perto do
teatro Castro Alves, me parece que era o Politeama.
Em 1978, vim morar em Rio
Branco no Acre. Havia apenas 2 cinemas O Cine Acre e o Cine Rio Branco. O Cine
Recreio, o primeiro da cidade no 2º Distrito, de 1948, estava desativado e só
seria revitalizado, nos anos 2000 pela Fundação Elias Mansour, e também seria
aberto o Cine João Paulo, na Av. Ceará. No final dos anos 80, quando militava
no PCB (Partidão), nós promovemos a vinda de alguns filmes de arte, que foram
exibidos no Cine Acre, de Jimy Barbosa, que era amigo do Pedro Vicente, um
cinéfilo da maior qualidade, que também era do Partidão. Trouxemos “O
Encouraçado Potemkin”, “Queimada”, “Atas de Marúsia” e outros que me fogem a
memória.
Outro filme que me marcou
foi, “Lula O Filho do Brasil, do Fábio Barreto, pelo fato de ter sido o filme
que vi na companhia de minha mãe, numa das salas do Shopping Midway em Natal.
Era o ano de 2010 e estava de férias naquela cidade. Ela nem gostava muito de
cinema, como o meu pai, mas me pediu para ver esse filme e fui com ela. Foi o
seu último filme. Logo em seguida o seu problema cardíaco se complicou, ela
ficou na UTI e não mais saiu. Virou poeira de estrelas no dia 22/02/2010 e
partiu sem saber que Lula havia feito a sua sucessão com Dilma Rousseff.
Nesse século XXI, os cinemas
de rua, dos mais simples aos mais requintados, sucumbiram todos. Hoje são
Igrejas Evangélicas, lojas diversas, oficinas ou simplesmente foram demolidos.
São poucos os que foram revitalizados preservando suas arquiteturas e a memória
cultural. Para os saudosistas do “escurinho do cinema”, só resta as salas
numeradas e pasteurizadas dos shoppings, que apesar do conforto e da técnica,
nem se compara ao charme e a magia dos cinemas da nossa juventude.
Agora já aposentado, de
“meio dia prá tarde” mas com a juventude ampliada, permaneço um apaixonado por
cinema. A tecnologia me possibilita assistir alguns desses filmes que ví na
infância, no conforto de minha rede dentro de casa e com o controle remoto na
mão. Esse aparelhinho me permite repetir as cenas mais interessantes ou para
ler completamente as legendas. Atualmente, nem filmes eu loco mais, pois as
locadoras, a exemplo das grandes salas de cinema, também já fecharam. Dispomos
agora do YouTube e da NETFLIX, com muitas opções de filmes, nos diversos
estilos, a nossa disposição sem sair de casa e a qualquer hora. Uma beleza!!
Rio Branco (AC), 02 de
janeiro (aniversário de 46 anos de casamento) de 2021
*Marcos Inácio Fernandes, é
professor aposentado e cultiva o “ócio criativo”
PS – Lembro que o operador
de cinema da Base Oeste, era Amadeu. Ele tinha uma moto e vinha anunciar os
filmes numa amplificadora que existia na casa do intendente da vila de
Parnamirim, que era vizinha a minha casa na rua Tenente Novais. Parnamirim
ainda não havia se tornado município autônomo. Quando o cinema passou para a
Base leste, o operador era Otácílio, um funcionário da Base.
Ah que texto delicioso de ler! Os cinemas de rua marcou nossa geração. Tinha uma sedução imensurável!
ResponderExcluirÉ verdade que hoje temos a tecnologia que nos faz ver e rever os filmes no conforto de casa e a qualquet hora mas nada se compara a magia da telona!
Obrigada amigo por me permitir embarcar nessa maravilhosa viagem ao tempo.E que memória essa sua! Parabens!