Eri Galvão e Aldir Blanc (1946-2020)
Esse Aí, Promete!
Por: Marcos Inácio
Fernandes
“Quando ele nasceu/Foi no sufoco/Tinha uma vaca, um burro e um louco/Que
recebeu seu sete.
Quando ele nasceu/Foi de teimoso/Com a manha e a baba do tinhoso/Chovia
canivete.
Quando ele nasceu /Nasceu de birra/ Barro ao invés de incenso e mirra/Cordão
cortado com gilete.
Quando ele nasceu/Sacaram o berro/Meteram a faca/Ergueram ferro/Aí Exu
falou:/Ninguém se mete!
Quando ele nasceu/Tomaram cana/Um partideiro puxou samba/Aí Oxum falou:
esse aí promete!”
(Gênesis – João Bosco e Aldir Blanc)
Quando Aldir Blanc escreveu esses
versos que João Bosco musicou, parece que estava falando dele próprio. Oxum
profetizou a sua trajetória promissora que expressou, maravilhosamente, a alma
brasileira através da música e da poesia com seus inúmeros parceiros.
Aldir encantou-se nesse 4 de maio de
2020. Ele deixa um legado de mais de 500 composições, algumas das quais, devem
ser incluídas em qualquer antologia que se faça dos “hinos” da Música Popular
Brasileira, que o povo canta, de cor e salteado, nas ruas. Era o “poeta da vida
do amor e da cidade... “o ourives do palavreado” como bem definiu Dorival
Caymmi. Foi um cronista da sua cidade maravilhosa, o Rio de Janeiro, e do Brasil.
Entre as suas poesias musicais tem
duas que me embevecem de forma particular. São duas “trilhas sonoras” do meu
coração pois elas me remetem a duas passagens que foram marcantes na minha
vida. A primeira música é “Bala com bala” da sua parceria com João Bosco, que a
Elis Regina gravou. Informe-se que, a Elis foi quem mais gravou as músicas da dupla
João Bosco/Aldir Blanc. A dupla só foi superada pelo Tom Jobim, outro gênio da
raça.
Pois bem essa música me lembra o ano
que passei em Brasília, na Vila Buritis em Planaltina. Era 1972 e morava com
meu irmão de criação Ailton e sua esposa Penha e seu filho pequeno Ricardo, que
eu iria ser seu padrinho. O Ricardo gostava muito dessa música e pedia prá
Penha cantar e quando ela dizia que não sabia, o Ricardo retrucava: a Elis
Regina não canta!? E Penha ria e eu mais ainda, só de em imaginar Penha, que nunca
cantou nem em coro de igreja, sendo comparada a grande Elis. Não batizei o
Ricardo. Ele teve uma meningite e veio a
óbito em 05/06 /1975, com 7 anos incompletos. Faleceu no mesmo dia que minha
mãe fazia aniversário. A última vez que vi o Ricardo em vida foi em 1974.
Estava no Rio fazendo um curso e, num feriado prolongado, dei um pulo em
Brasília para visitar meu irmão e lembro de ter tirado uma foto com ele,(que
não acho agora). Toda vez que escuto Bala com bala, me vem essas lembranças
alegres e tristes.
A outra música que me toca o coração
é a “Valsa do Maracanã”, que Aldir fez com o Paulo Emílio. Ouvi essa música
pela primeira vês na vóz do próprio Paulo Emílio, já bem chumbado, no Bar do
João na Tijuca no Rio de Janeiro, em novembro de 1987. Eri Galvão, tocava nesse
bar e foi com ele, que conheci muitas músicas do repertório do Aldir com João
Bosco e outros parceiros.
Em 1987, juntamente com Cacá,
Monteiro, Cesário (pai do Cesarinho, presidente do nosso partido) e outros
colegas e amigos da EMATER, fomos demitidos, por perseguição política, no
governo Flaviano Melo. Mesmo demitidos
fomos participar do 1º Congresso das Associações dos Servidores de Ater –
CONFASER, em Curitiba no Paraná, ocorrido em final de outubro. Nesse evento, os
companheiros do Brasil da Extensão Rural, me distinguiram com a presidência do
Congresso e após seu encerramento, uma parte da nossa delegação voltou prá Rio
Branco e outra parte, ( eu, Monteiro, Cacá, Maria de Toinho, Graça Melo) e outros
que não me recordo, deram uma esticadinha no Rio e ficamos no Ap. do pai de
Monteiro.
Ficou bem nítida na minha lembrança
essa “esbórnia” que fizemos na noite carioca com a participação do Paulo
Emílio, que viria falecer, precocemente, em 1990. Paulo foi juntamente com
Aldir Blanc, Gonzaguinha, Márcio Proença (que também conheci em outra passagem
pelo Rio e que também já subiu), Ivan Lins, Lucinha Lins, César Costa Filho e,
tantos outros, fizeram parte do Movimento Artístico Universitário – MAU, nos 70.
Entre as composições do Paulo Emílio com Aldir e João Bosco que ficaram
antológicas foi “Linha de Passe” e “Nação”, que a Clara Nunes imortalizou.
Saudações cruzmaltinas Aldir Blanc.
Você partiu como nasceu, “num sufoco”, não teve nem gurufim por conta da
pandemia. Que os Orixás, com Oxum a frente, faça as honras prá lhe receber na
roda de partideiros que deve acontecer aí por cima com sua chegada.
Eu vou “tomar a penúltima” e ficando
por aqui me equilibrando na esperança.
Rio Branco (AC),08 de maio (75º
aniversário da queda do nazismo, em Berlim, pelo Exército Vermelho), de 2020.
Marcos Inácio Fernandes, é professor
aposentado e Secretário de Formação do PT/DM de Rio Branco.
PS – As letras das trilhas sonoras do
meu coração.
Bala com Bala (João Bosco / Aldir Blanc)
A sala cala e o jornal prepara quem está na sala
Com pipoca e com bala e o urubu sai voando, manso
O tempo corre e o suor escorre, vem alguém de porre
Há um corre-corre, e o mocinho chegando, dando.
Eu esqueço sempre nesta hora (linda, loura)
Minha velha fuga em todo impasse;
Eu esqueço sempre nesta hora (linda loura)
Quanto me custa dar a outra face.
O tapa estala no balacobaco e é bala com bala
E fala com fala e o galã se espalhando, dando.
No rala-rala quando acaba a bala é faca com faca
É rapa com rapa e eu me realizando, bambo.
Quando a luz acende é uma tristeza (trapo, presa),
Minha coragem muda em cansaço.
Toda fita em série que se preza (dizem, reza)
Acaba sempre no melhor pedaço.
Com pipoca e com bala e o urubu sai voando, manso
O tempo corre e o suor escorre, vem alguém de porre
Há um corre-corre, e o mocinho chegando, dando.
Eu esqueço sempre nesta hora (linda, loura)
Minha velha fuga em todo impasse;
Eu esqueço sempre nesta hora (linda loura)
Quanto me custa dar a outra face.
O tapa estala no balacobaco e é bala com bala
E fala com fala e o galã se espalhando, dando.
No rala-rala quando acaba a bala é faca com faca
É rapa com rapa e eu me realizando, bambo.
Quando a luz acende é uma tristeza (trapo, presa),
Minha coragem muda em cansaço.
Toda fita em série que se preza (dizem, reza)
Acaba sempre no melhor pedaço.
“Valsa do Maracanã” (Paulo Emílio / Aldir Blanc)
“Quando
eu ficar assim
morrendo após o porre
Maracanã, meu rio,
ai corre e me socorre
Injeta em minhas veias
teu soro poluído
de pilha e folha morta,
de aborto criminoso
de caco de garrafa
de prego enferrujado
dos versos do poeta
pneu de bicicleta
Ai, rio do meu Rio,
Ai, lixo da cidade
de lâmpada queimada
de carretel de linha
chapinha premiada
e lata de sardinha
o castigo e o perdão
o modess e a camisinha
o castigo e o perdão
o modess e a camisinha
Ai, só dói quando eu rio,
Maracanã, meu rio
Maracanã, meu rio
Ai, só dói quando eu rio.”
morrendo após o porre
Maracanã, meu rio,
ai corre e me socorre
Injeta em minhas veias
teu soro poluído
de pilha e folha morta,
de aborto criminoso
de caco de garrafa
de prego enferrujado
dos versos do poeta
pneu de bicicleta
Ai, rio do meu Rio,
Ai, lixo da cidade
de lâmpada queimada
de carretel de linha
chapinha premiada
e lata de sardinha
o castigo e o perdão
o modess e a camisinha
o castigo e o perdão
o modess e a camisinha
Ai, só dói quando eu rio,
Maracanã, meu rio
Maracanã, meu rio
Ai, só dói quando eu rio.”
Somente podemos lamentar e chorar.
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